Sinopse Companhia das Letras: Alice conhece Felix pelo Tinder. Ela é romancista, ele trabalha num armazém nos subúrbios de uma pequena cidade costeira da Irlanda. No primeiro encontro, enquanto os dois tentam impressionar, a fagulha de algo mais aparece. Em Dublin, Eileen está tentando superar o término de seu último relacionamento enquanto precisa lidar com a falta da melhor amiga, que se mudou para o litoral. Ela acaba voltando a flertar com Simon, um homem mais velho que acompanha sua vida há tempos. Alice, Felix, Eileen e Simon ainda são jovens, mas sentem cada vez mais a pressão do passar dos anos. Eles se desejam, se iludem, se amam e se separam. Eles se preocupam com sexo, com amizade, com os rumos do planeta e com o próprio futuro. Seriam eles as últimas testemunhas do ocaso? Eles vão conseguir encontrar uma forma de viver mais uma vez em um belo mundo? Com uma prosa única e brutal, Sally Rooney constrói mais um romance inigualável sobre o que significa amadurecer sem deixar a si mesmo para trás. (Resenha: Belo Mundo, onde você está – Sally Rooney )
Opinião: Sally Rooney é sempre uma caixinha de surpresas. Em “Belo mundo, onde você está”, os sentimentos são diversos. O início pode ser complicado para o leitor que não está acostumado com a escrita da autora. Já o final pode ser fraco para os fãs mais fervorosos da simplicidade que machuca encontrada em “Pessoas normais” e “Conversas entre amigos”.
Dessa vez, Sally optou por trazer personagens na casa dos vinte e tantos ou trinta e poucos (ou seja, vem crise aí!). Alice é uma escritora que, depois de alguns problemas, vai morar em uma cidade pequena na Irlanda. Em sua passagem pelo Tinder, acaba conhecendo Felix – com quem tem um péssimo primeiro encontro, mas os dois acabam se envolvendo mesmo assim. Intercaladamente, o leitor acompanha a melhor amiga de Alice, Eileen, que trabalha como editora de uma revista literária em Dublin. Ao terminar um relacionamento (que, convenhamos, não era dos melhores), Eileen se vê atraída mais uma vez por Simon, um homem que faz parte da sua vida há muito tempo.
As duas histórias se interligam através de e-mails entre um capítulo e outro da vida de cada uma das amigas – e, nesse quesito, o título de “Conversas entre amigos” faz até mais sentido do que no livro de 2017. E o interessante no desenvolvimento dessa amizade é o que cada uma pensa e se relaciona com a outra. Não é uma amizade comum daquelas em que o leitor lê e se sente abraçado pelas personagens. Pelo contrário, o leitor aqui pode se sentir bem desconfortável com algumas atitudes de Alice com Eileen e vice-versa. O trabalho de Sally Rooney aqui é realmente incomodar. E como ela sabe fazer isso…
A autora tem ciência de sua marca registrada e usa e abusa dela sem o menor pudor. O leitor que já se acostumou com as cenas em que, aparentemente, nada acontece para no final entender a puta reflexão por trás vai se sentir em casa. O leitor que já se acostumou com os diálogos peculiares e sem marcações de fala nos textos de Rooney vai se sentir em casa. O leitor que já se acostumou (mas que ainda assim revira os olhos e consegue dar boas risadas) com os personagens inteligentes e palestrinhas que adoram discutir sobre política e o mundo atual numa festa também vai se sentir em casa.
Então, sim, esse é mais um típico romance contemporâneo sobre pessoas normais (sem trocadilho), em situações corriqueiras e, muitas vezes, agindo de forma estúpida e egoísta. E, sinceramente, quem não é nem um pouquinho egoísta em pleno 2021 que atire a primeira pedra! Mas, mais que isso. Rooney não só usa seus recursos. Ela brinca com eles e tira sarro de si mesma durante toda a narrativa e isso deixa o livro mil vezes mais genial.
Em algumas partes, inclusive, é difícil entender se ela está tirando sarro ou se realmente quis inserir daquela forma. Por exemplo: em algumas trocas de e-mails entre Alice e Eileen, as duas comentam sobre fatos que encontraram na Wikipédia, levando realmente a sério o que estava escrito. É cômico pensar que uma romancista e uma editora de revista literária realmente acreditem no que está na Wikipédia, mas está nas páginas do livro. Muito provavelmente essa relação de hipocrisia entre os personagens e suas atitudes e/ou discursos pode vir a ser um dos problemas para alguns leitores. Vai depender única e exclusivamente da interpretação que cada um terá do texto de Sally Rooney (e em comparação com suas outras obras também).
O que realmente deixou a desejar foi a carga de “moral da história” inserida no final. A tacada do momento em que a história se passa foi inteligente (apesar de esperada) e, com certeza, vai ajudar o leitor a se aproximar mais dos personagens. Porém, a conclusão não condiz muito com o estilo da autora. Acabou dando uma sensação muito mais comercial do que as outras duas obras dela. O que até faz sentido, já que é seu primeiro romance depois do tremendo sucesso de seus dois outros livros. Mas acaba decepcionando um pouco os leitores já habituados com seus textos e, principalmente, com seus desfechos. É o final ideal para os novos leitores de Sally Rooney, muito mais propício de agradar do que, por exemplo, o final de “Pessoas normais”. Porém, durante todo o livro, elementos costumeiros da autora são destrinchados e muito utilizados, o que pode não agradar de cara quem começar a se aventurar pelos textos dela por esse em específico.
Acaba sendo realmente difícil saber pra quem recomendar qualquer livro da autora irlandesa. São narrativas cruas, simples, irritantes, desesperadas, reconfortantes, enfadonhas e… tristes. Assim como qualquer outro livro, filme, série, etc., não é um estilo que vai agradar todo mundo. Sally Rooney parece saber exatamente para quem escreve suas histórias e vai fundo até o fim da história. São pessoas normais, são pessoas que precisam de ajuda, são pessoas que sofrem, que erram, que choram, que estragam tudo, que não se permitem ser felizes, que possuem traumas. São pessoas. Os personagens e os leitores. É forte, é doloroso, é erótico, é livre, é bonito, é comum!
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